Alessia Cara passou o último verão encontrando forças na dor. Ela gravitou ainda mais em direção às faixas pop melancólicas pelas quais é conhecida, aproveitou todas as emoções negativas que se lembra de ter sentido na época e as colocou na mistura efervescente de seis faixas, This Summer; seu terceiro lançamento e primeiro projeto não tradicional, criado inteiramente em turnê.

E este verão (de verdade) não foi muito diferente. A cantora/compositora vencedora do Grammy retornou em 17 de julho com This Summer: Live Off the Floor, uma releitura acústica do EP emotivo do ano passado, completo com sessões de gravação feitas principalmente no estúdio, uma banda completa — creditada inteiramente na arte da capa do projeto como alguns de seus discos favoritos de jazz vintage — e uma causa de caridade abrangente por trás disso.

“Esta foi a primeira vez em que eu virei uma situação ao ponto de poder encontrar forças e autoconfiança no sofrimento, e coloquei para fora ao invés de deixar isso me consumir”, Cara diz ao SPIN pelo Zoom. “Então, toda vez que eu o revisito, seja fazendo essa nova versão ou apenas ouvindo, eu sempre consigo voltar atrás e lembrar daquela força que vem com esses sentimentos que não eram tão bons na época.”

Cara queria ajudar o maior número possível de comunidades com o projeto, ela diz que, pelos próximos 21 anos, promete doar todos os recursos deste EP para a Save the Children; uma organização global que garante que as crianças tenham abrigo, comida, proteção, saúde e educação.

“Pensamos que sozinhos, sendo apenas uma pessoa, não conseguiremos fazer a diferença. O que é, claro, uma mentalidade justa.”, disse Cara. “Mas não é verdade. Sinto que todos podem fazer isso coletivamente. ”

Na semana passada, Cara falou sobre seu projeto mais recente e como uma pessoa pode fazer a diferença apenas sentada no chão do estúdio, ao lado de um cara tocando xilofone.

Como você se manteve criativa nos últimos quatro ou cinco meses de quarentena?

Mesmo que eu não esteja colocando muita pressão em mim mesma para ser produtiva, eu estou tentando me manter criativa e manter minha mente fluindo. E é difícil, tenho que dizer, porque eu costumo compor sobre experiências pessoais e auto-reflexão, e quando há tão pouco movimento no mundo e poucas experiências, é difícil tirar proveito. Então eu estou tendo que usar minha imaginação um pouco.

O que em particular fez deste o momento certo para lançar um EP acústico gravado em outubro?

Em termos de tempo, foi legal, porque acabou que estamos lançando a versão nova do This Summer no verão seguinte ao lançamento. Então ainda está no verão… Mas como eu disse, no aspecto mais sobre consciência social, eu tenho estado em casa, o que tem me permitido aprender sobre muitas coisas que acontecem no mundo. E eu sinto que agora é a hora de trazer atenção para essas coisas e ajudar o máximo que podemos.

O que o This Summer significa para você agora que está regravando ou performando essas músicas um ano depois?

Eu sinto que o projeto foi, enquanto se originou de um monte de sentimentos esquisitos e negativos, eu sinto que eu fui capaz de canalizar algo que eu nunca tinha feito antes, que é uma nova perspectiva, ou uma nova autoconfiança sobre o sofrimento ou a autoconfiança dentro do sofrimento que eu nunca falei sobre antes, tipo, minha música é muito melancólica, geralmente. Mas esta foi a primeira vez em que eu virei uma situação ao ponto de poder encontrar forças e autoconfiança no sofrimento, e coloquei para fora ao invés de deixar isso me consumir. Então, toda vez que eu o revisito, seja fazendo essa nova versão ou apenas ouvindo, eu sempre consigo voltar atrás e lembrar daquela força que vem com esses sentimentos que não eram tão bons na época.

Claro. E eu não estou tentando ser engraçado, mas como foi gravá-las enquanto estava fisicamente sentada no chão?

De algumas formas é um pouco mais confortável, mas de outras formas é um pouco restrito pois você não pode ficar se movendo por aí. Eu gosto de balançar meus braços e gosto de me mexer muito, e quando você está sentado é um pouco diferente, você não pode se mover muito e você tem que focar na voz… “Like You”, em particular, essa música nós fizemos completamente no chão. Foi engraçado porque um dos músicos é super alto e ele teve que deitar de bruços para tocar o xilofone.

E essa ideia de colocar o nome de todos eles na capa do projeto, isso é algo que você queria que acontecesse mais na música?

Eu mesma sou compositora e eu tenho a sorte de poder ser uma artista também. Mas se eu estivesse somente compondo ou se fosse só música, mais por trás das cenas, seria importante para mim ser creditada. Eu gostaria que não me deixassem de lado. E como artista eu sei o que é preciso para lançar uma música, e mesmo que eu escreva minhas músicas, há muita coisa por trás.

Você disse algo no Twitter sobre “Ready” ser a mais emocionante de regravar. Por quê?

É muito estranho como as coisas evoluem, porque minhas emoções são sempre assim. Há canções que eu escrevo sobre certas situações que acabam se tornando sobre outras ao cantá-las. Tipo, você as interpreta de maneira diferente. Então, eu sinto que sempre estou me identificando de certa forma. Mas algumas atingem mais do que as outras, porque algumas coisas foram um pouco mais difíceis de superar. Então revisitá-las é como se eu estivesse voltando para aquele tempo, o que pode ser difícil às vezes. E vice-versa. Digo, às vezes, músicas que antes eram felizes acabam se tornando emocionantes também porque é tipo “bom, eu não estou mais lá.” Acontece dos dois jeitos.

O que a Save the Children significa para você pessoalmente e por que é para lá que todos os lucros do EP vão?

Eu estava tentando pesquisar sobre os lugares que mais precisam. E eu percebi que os problemas vão além da América do Norte. Digo, nós temos visto esse movimento gigante que está acontecendo nos Estados Unidos e eu queria trazer atenção para isso. Mas aí, ao ler mais, eu percebi que há uma enorme fome e guerra acontecendo no Iêmen. E todas aquelas crianças estão sofrendo muito, muito mesmo. E mesmo dentro do meu país, no Canadá, há os maus tratos a comunidades indígenas e todas essas coisas para as quais eu estou abrindo meus olhos que eu admito que não tinha ideia de que estavam acontecendo. Então eu pensei tipo “o que eu posso fazer para ajudar o maior número possível de comunidades? Qual grupo de pessoas eu devo focar? Tipo, como posso ajudar a longo prazo?” E quando você olha para o mundo e para nossas esperanças para o futuro, você percebe que as crianças serão as responsáveis por essa mudança.

Claro. E enquanto esse EP envelhece pelos próximos 21 anos — o tempo que você prometeu doar os lucros — o que você espera que ele sirva para os seus fãs?

Pensamos que sozinhos, sendo apenas uma pessoa, não conseguiremos fazer a diferença. O que é, claro, uma mentalidade justa. Mas não é verdade. Eu sinto que todos podem fazer isso coletivamente. E então eu acho que quando eles estiverem ouvindo, eu espero que eles saibam que estão fazendo algo bom pelo mundo, mesmo que seja uma coisa pequena, toda ajuda conta… Então, eu espero que quando eles ouçam, eles saibam que estão contribuindo para algo muito bom, mesmo que seja uma pequena parte.

 

Esta entrevista foi traduzida do site SPIN.